quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Comentários sobre a Lei Antiterrorismo

Por que uma Lei Antiterror?

Brasil permanece sem estratégia antiterror (24/03/2013 http://ow.ly/tBfwv)
Assim a Folha alerta da necessidade de se pensar uma legislação que tipifique o crime de terrorismo, tendo em vista o Brasil sediar eventos internacionais como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. O alarme veio antes das Jornadas de Julho, as que levaram milhões de brasileiros às ruas.

Brasil precisa de legislação antiterror, alerta Polícia Federal (21/09/2013 http://ow.ly/tBgpm)
O alerta continua, mesmo após as Jornadas. Continua porque o Brasil continuará a sediar os mesmos eventos. Esses eventos, num passado não tão distante, foram alvos de ações terroristas como o triste episódio do Massacre de Munique (veja aqui uma lista de 10 atentados ocorridos em eventos esportivos http://ow.ly/tBisz).

Dúvidas que pairam

Usar a legislação da Lei Antiterrorismo para incriminar movimentos sociais é o grande ponto que entrava a aprovação do texto. O debate, que deve ser amplo, seguindo o rito de uma democracia sedimentada, já envolveu a tramitação de seis projetos tratando do tema (na Câmara dos Deputados o mais antigo é de 1991, e o mais recente, de 2012). Muito se avançou nesse meio tempo, inclusive o fortalecimento da democracia brasileira, com a superação de alguns resquícios da ditadura.

Lei Antiterrorismo é para todos...

O texto mais adiantado falha em não explicitar a assertiva "Lei Antiterrorismo é para todos os terroristas". Contudo, não impede que ainda se faça um projeto responsável, seguro para os que democraticamente se posicionam em suas lutas. As Jornadas de Julho se mostraram palco de ações violentas por parte de grupos anti-democráticos, grupos que incitam a barbárie em tempos de paz. Tais grupos, mesmo que não se enquadrem no esteriótipo de terrorista (tais como os barbudões integrantes da Al Qaeda, por exemplo) também não se enquadram como movimento social, de espécie alguma. Ao contrário, atuam de forma a despolitizar o debate, agem por meio de ações que assustam os fracamente politizados, se valem do anonimato criminoso, objeto de manobras escusas. Tais grupos não se propõem a atuar politicamente e seguem estratégias estranhas à sociedade civil organizada (quando não nocivas e assassinas a todos), logo, não encontram respaldo e suporte dos trabalhadores.

O outro lado

Poder-se-ia dizer que alguns dos atuais políticos do quadro do governo (e fora) se enquadrariam no projeto de Lei Antiterror? Certamente que sim. Mas seria injusto comparar épocas um tanto diferentes, que demandam estratégias diferentes. Naturalmente há a preocupação por parte dos movimentos sociais, assim como dos que sofreram as agruras de um negro período ditatorial, em não confundir alhos com bogalhos. O crime de terrorismo é sui generis, e, como tal, não deve ser tratado genericamente.

Além das especificações

Para além de uma matéria que se proponha fechar o debate, há uma possibilidade de resolução ao impasse. Trata-se do novo Código Penal (http://ow.ly/tBtPF), também em tramitação no Senado. O texto tipifica o crime de terrorismo com pena de até 20 anos e é explícita ao afirmar que "não constitui crime de terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua finalidade".

AI-5 em 2014

Marconi Perillo, como de praxe em seu desgoverno de 16 anos, foi conivente com mais outro ataque à democracia e mau exemplo aos estados que sediarão Copa e Olimpíadas. O AI-5 tucano (http://ow.ly/tBq6Y - http://ow.ly/tBrUV - http://ow.ly/tBs48) vai de encontro ao debate promovido e pedido pela civilidade do momento. O calor das manifestações não pode ser resfriado com autoritarismo, mas fomentado pelo bom debate e ação, itens que o governador notoriamente desconhece.

O polêmico Manual de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) http://www.defesa.gov.br/arquivos/File/doutrinamilitar/listadepublicacoesEMD/md33_m_10_glo_1_ed2013.pdf

PLS 236/2012 Anteprojeto do novo Código Penal http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=111516&tp=1

PLS 499/2013 que define crimes de terrorismo 
http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=141938&tp=1

Imagens surrupiadas de Caius Brandão

sábado, 25 de janeiro de 2014

Questionário breve sobre a Lei Nº 11.516 - Criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

  • Que lei cria o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes?
    • Lei Nº11.516
  • O que é o Instituto Chico Mendes?
    • O Instituto Chico Mendes é uma autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente.
  • Quais as finalidades do Instituto Chico Mendes?
    • I - executar ações da política nacional de unidades de conservação da natureza, referentes às atribuições federais relativas à proposição, implantação, gestão, proteção, fiscalização e monitoramento das unidades de conservação instituídas pela União;
    • II - executar as políticas relativas ao uso sustentável dos recursos naturais renováveis e ao apoio ao extrativismo e às populações tradicionais nas unidades de conservação de uso sustentável instituídas pela União;
    • III - fomentar e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade e de educação ambiental;
    • IV - exercer o poder de polícia ambiental para a proteção das unidades de conservação instituídas pela União; e
    • V - promover e executar, em articulação com os demais órgãos e entidades envolvidos, programas recreacionais, de uso público e de ecoturismo nas unidades de conservação, onde estas atividades sejam permitidas.
O disposto no inciso IV do caput deste artigo não exclui o exercício supletivo do poder de polícia ambiental pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.
  • Como será administrado o Instituto Chico Mendes?
    • Será administrado por 1 (um) Presidente e 4 (quatro) Diretores.
  • Como se darão as relações do ICMBio com o Ibama?
    • O patrimônio, os recursos orçamentários, extra-orçamentários e financeiros, o pessoal, os cargos e funções vinculados ao Ibama, relacionados às finalidades elencadas no art. 1o desta Lei ficam transferidos para o Instituto Chico Mendes, bem como os direitos, créditos e obrigações, decorrentes de lei, ato administrativo ou contrato, inclusive as respectivas receitas. Ato do Poder Executivo disciplinará a transição do patrimônio, dos recursos orçamentários, extra-orçamentários e financeiros, de pessoal, de cargos e funções, de direitos, créditos e obrigações, decorrentes de lei, ato administrativo ou contrato, inclusive as respectivas receitas do Ibama para o Instituto Chico Mendes.
  • Quantos são os cargos criados, no âmbito do Poder Executivo, comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DAS e Funções Gratificadas – FG, para integrar a estrutura do Instituto Chico Mendes?
    • 1 (um) DAS-6;
    • 3 (três) DAS-4; e
    • 153 (cento e cinqüenta e três) FG-1.
As funções de que trata o inciso III do caput deste artigo deverão ser utilizadas exclusivamente para a estruturação das unidades de conservação da natureza instituídas pela União, de acordo com a Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Questões sobre o Planejamento Estratégico Situacional

O Planejamento Estratégico Situacional no nível local: um instrumento a favor da visão multissetorial (Elizabeth Artmann)

Optamos, para fins de elaboração deste texto, por apresentar os principais fundamentos teórico-metodológicos do PES com adaptações propostas, sendo algumas já adotadas e testadas em experiências de planejamento no nível local. (Artmann, 1993; Rivera & Artmann, 1993; Artmann, Azevedo & Sá, 1997).

  • O que é o Planejamento Estratégico Situacional (PES)?
    • O PES é um método de planejamento por problemas e trata, principalmente, dos problemas mal estruturados e complexos, para os quais não existe solução normativa ou previamente conhecida como no caso daqueles bem estrutrados.
  • Onde, como e quando surgiu o PES?
    • O PES foi idealizado por Matus, autor chileno, a partir de sua vivência como ministro da Economia do governo Allende, no período de 1970-73, e da análise de outras experiências de planejamento normativo ou tradicional na América Latina cujos fracassos e limites instigaram um profundo questionamento sobre os enfoques e métodos utilizados.
  • Qual a grande área do PES?
    • O enfoque do PES surge no âmbito mais geral do planejamento econômico-social.
  • E suas áreas de aplicação?
    • Vem sendo crescentemente adaptado e utilizado em áreas como saúde, educação e planejamento urbano, por exemplo. 
  • Qual o objeto de análise e intervenção do PES?
    • Os processos sociais e o reconhecimento de sua complexidade, fragmentação e a incerteza que os caracteriza.
  • Explique melhor esses processos sociais.
    • Os processos sociais se assemelham a um sistema de final aberto e probabilístico, onde os problemas se apresentam, em sua maioria, não estruturados e o poder se encontra compartido, ou seja, nenhum ator detém o controle total das variáveis que estão envolvidas na situação.
  • Como fica a aplicabilidade nos diversos níveis, desde o local ao global?
    • O método foi desenhado para ser utilizado no nível central, global, porém, seu formato flexível possibilita a aplicação nos níveis regionais/locais ou mesmo setoriais, sem, contudo, deixar de situar os problemas num contexto global mais amplo, o que permite manter a qualidade da explicação situacional e a riqueza da análise de viabilidade e de possibilidades de intervenção na realidade. 
  • Em linhas gerais, como seria o plano de intervenção no PES?
    • Matus desenvolveu os conceitos de espaço do problema e espaço de governabilidade do ator, bem como propôs o desenho de um plano de intervenção em dois níveis: o plano de ação que abrange as causas dos problemas situadas dentro do espaço de governabilidade do ator e o plano de demandas que aborda as variáveis sob o controle de outros atores.
  • Sob quais abordagens o PES se foca?
    • É importante destacar que, embora se possa partir de um campo ou setor específico, os problemas são sempre abordados em suas múltiplas dimensões - política, econômica, social, cultural, etc. e em sua multissetorialidade, pois suas causas não se limitam ao interior de um setor ou área específicos e sua solução depende, muitas vezes, de recursos extra-setoriais e da interação dos diversos atores envolvidos na situação.
  • Buscando enfrentar a questão da operacionalização de um método complexo e sofisticado no nível local, como se dão os outros níveis?
    • Matus propõe a trilogia PESZOPP (sigla em alemão de Zielorientierte Projektplanung - Planejamento por Projetos Orientado por Objetivos) e MAPP (Método Altadir de Planejamento Popular), desenhados, respectivamente, para os níveis central, intermediário e local/popular. O autor sugere a combinação destes métodos, segundo a hierarquia e a complexidade dos problemas abordados, destacando a coerência e identidade de concepção metodológica entre eles.
  • Discorra um pouco mais acerca do PES.
    • O PES, segundo Matus, é um método de alta complexidade e alta potência, apropriado para o nível diretivo de instituições de grande porte e com pessoal especializado. O PES propõe a construção de viabilidade para o plano ainda na situação inicial.
  • Discorra um pouco mais acerca do ZOPP.
    • O ZOPP  é um método de complexidade intermediária, com limitações para fazer análise estratégica e abordar determinados problemas que definem uma situação global (macroproblemas). É adequado para trabalhar em nível operacional específico e sofreu algumas modificações do original alemão para integrar o sistema PES. O ZOPP abandona as alternativas não viáveis na situação inicial.
  • Discorra um pouco mais acerca do MAPP.
    • O MAPP constitui-se, para o autor, num bom método por problemas a ser operacioanlizado no nível popular, associações de moradores e instituições de pequeno porte mas possui também limitações.
  • Qual seria uma limitação do ZOPP e MAPP? Como contorná-la?
    • Não há, nesses planos, uma análise de viabilidade mais aprofundada, com o abandono das alternativas não viáveis na situação inicial. Sendo o ZOPP e o MAPP bastante limitados neste aspecto, propomos a operacionalização do PES mesmo no nível local, com as adaptações necessárias, tendo-se o cuidado de não simplificá-lo a ponto de perda de potência na abordagem global e estratégica dos problemas.

OS CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO PES 

O conceito de planejamento

  • Dê-nos uma noção de planejamento
    • O planejamento pode ser entendido como um cálculo que precede e preside a ação. O alargamento do planejamento para além do cálculo representa um avanço, na medida em que incorpora aspectos de gerência, aspectos organizacionais e a ênfase no momento tático-operacional, ou seja no planejamento da conjuntura e na avaliação e atualização constante do plano. O planejamento passa a estar intrinsecamente vinculado à ação e aos resultados/impactos e não somente ao cálculo que antecede a ação.

O ator e o problema 

  • Segundo Matus, o que seria um problema?
    • Para Matus, um problema não pode ser apenas um “mal-estar” ou uma necessidade sentida pela população. Um problema suscita à ação: é uma realidade insatisfatória superável que permite um intercâmbio favorável com outra realidade. 
  • Então, na abordagem matusiana, isso significa dizer que um problema nunca é “solucionado”...
    • Definitivamente, mas uma intervenção eficaz na realidade deve produzir um intercâmbio positivo de problemas.
  • O que é necessário para se caracterizar um problema?
    • É fundamental que o problema seja definido e declarado por um ator disposto e capáz de enfrentá-lo.
  • Para o ator, segundo Matus (1994b), que critérios deve-se preencher? 
    • Deve-se preencher três critérios: 
      • Ter base organizativa 
      • Ter um projeto definido 
      • Controlar variáveis importantes para a situação. 
  • Quem poderia configurar como ator?
    • O ator pode estar representado pela direção de um sindicato, de um partido político ou de uma associação de moradores, considerando-se vários subatores (por exemplo, o presidente do sindicato pode ter uma posição e outro membro importante outra) ou pode ser uma pessoa: o prefeito, o secretário de saúde ou de educação. Alguém deve sempre responder pelo plano, portanto não é correto nem útil dizer que a secretaria de saúde ou a prefeitura são os atores. Neste caso, o prefeito e o secretário de saúde seriam os atores.
  • Mais alguma consideração sobre o ator?
    • Matus (1994b) chama a atenção para o fato de que um assessor não é ator, podendo ser chamado de autor do plano. Portanto, um grupo responsabilizado pela elaboração de um projeto não pode ser considerado um ator; a autoridade que o instituiu é que representa o ator. É importante ter claro o ator que assina o plano. Este sempre controla pelo menos algumas variáveis relevantes na situação e, além do ator-eixo ou ator principal, os outros atores que controlem recursos ou variáveis importantes devem ser considerados.
  • Como seriam classificados os problemas?
    • Matus (1987) formula uma primeira classificação dos problemas em: 
      • bem estruturados
      • quase-estruturados
      • mal-estruturados
  • A que se referem os problemas bem estruturados?
    • Referem-se a problemas que respondem a leis ou regras claras, invariáveis e/ou comportamentos previamente conhecidos e cujas soluções podem ser normatizadas. Podem ser tratados, portanto, segundo modelos determinísticos de análise, pois se conhecem todas as variáveis intervenientes e suas formas de articulação.
  • A que se referem os problemas quase-estruturados e mal-estruturados?
    • Dizem respeito a situações problemáticas de incerteza nas quais não se pode enumerar todas as variáveis envolvidas e que só podem ser tratados a partir de modelos probabilísticos e de intervenções criativas. 
  • Quais as características desses problemas semi ou quase-estruturados?
    • Matus (1987) enuncia as seguintes características eles:
      • fazem parte de problemáticas que mobilizam vários atores, leituras e propostas de intervenção às vezes divergentes ou simplesmente diferentes, configurando uma área não necessariamente consensual a priori; 
      • ainda que tenham uma dimensão técnica, destaca-se o âmbito sócio-político, não sendo possível uma abordagem objetiva, o que não significa abandonar o rigor; 
      • não são facilmente isoláveis, pois dependem na sua geração e no seu enfrentamento de outros problemas, com os quais se entrelaçam; as fronteiras entre eles são, muitas vezes, difusas e a solução de um problema pode criar dificuldades à solução de outros; 
      • dependem do contexto maior onde se inserem, do cenário constituído por uma série de circunstâncias não controladas que nele interferem, possuindo, portanto algum grau de incerteza; 
      • supõem um enfoque de enfrentamento caracterizado pelo julgamento estratégico, 
      • reflexivo; 
      • seu enfrentamento depende de uma abordagem multissetorial.
  • Tomando o âmbito da saúde da população, em seu conceito amplo, temos que exemplo de problemática? Por quê?
    • Temos uma problemática semiestruturada ou inestruturada, pois ela articula-se com âmbitos diversificados como saneamento básico, habitação, condições de urbanização e de trânsito, hábitos de vida das pessoas, nível de renda e educação, entre outros.
  • Qual outro tipo de classificação para os problemas?
    • Os problemas podem ser ainda classificados em finais ou intermediários, e em atuais e potenciais. 
  • A que se referem os problemas finais?
    • Os problemas finais referem-se à missão institucional ou seja, àqueles vividos pela clientela, pela população que justifica a existência da organização.
  • A que se referem os problemas intermediários?
    • Os intermediários são aqueles problemas-meio que não se relacionam diretamente ao produto final mas seu enfrentamento é necessário para viabilizar a missão das organizações e dele depende também a qualidade dos produtos finais. 
  • Cite exemplos de problemas intermediários.
    • A missão de um posto de saúde ou de um hospital está relacionada à prestação de serviços de saúde à população, ainda que em diferentes níveis de complexidade. É necessário, nesse posto ou hospital, enfrentar problemas intermediários como organizar a lavanderia do hospital ou contratar serviços terceirizados, resolver o problema de gerência do ambulatório, etc. Uma Associação de Moradores tem como missão defender os interesses de seus moradores e buscar soluções para problemas como segurança, água, entre outros, mas precisa enfrentar questões intermediárias como a necessidade de uma secretaria, a definição de um local para reuniões, etc. Uma escola deve prestar ensino de qualidade à crianças de determinada faixa etária. Todos os problemas relacionados a esta missão, como alto índice de repetência e evasão escolar são finais. Os intermediários seriam os baixos salários dos professores ou rede física inadequada por exemplo, cujo enfrentamento se justifica na medida em que corrobora no alcance dos produtos finais.
  • A que se referem os problemas atuais?
    • Os problemas atuais são aqueles que se manisfestam hoje, no presente. 
  • A que se referem os problemas potenciais?
    • Os problemas potenciais referem-se a processos tendenciais que levariam à expressão de problemas no futuro e para os quais é necessária uma atuação preventiva. 
  • Que postura deve-se tomar na identificação de problemas potenciais?
    • Deve-se tomar uma postura extremamente estratégica no sentido de evitar situações graves e também de economizar custos, sejam econômicos ou políticos.

Anexos

O diagnóstico situacional é uma ferramenta de gestão de fundamental importância para o levantamento de problemas e para a construção do planejamento estratégico, que possibilita desenvolver ações de saúde
focalizadas e efetivas, direcionadas aos problemas encontrados. Inadequações nos serviços de uma instituição contribuem para um ambiente desfavorável tanto para os usuários como para os profissionais,
comprometendo, assim, a qualidade do serviço ofertado.
O diagnóstico situacional constitui o levantamento de uma situação real de uma organização, com intuito de conhecer a empresa ou o negócio, sendo uma das mais importantes ferramentas de gestão. Pois
conhecer a realidade de uma instituição possibilita identificar problemas, necessidades e propor intervenções e projetos que visem melhorias dos serviços e processos. 

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Questões sobre a desmilitarização da PM


  • Quem autoriza a barbárie policial? De que forma ela é autorizada?
    • A sociedade em seu conjunto é quem autoriza, hoje, a barbárie policial, aplaudindo execuções, elegendo políticos que defendem o direito penal máximo e governos que acionam a violência do Estado.
  • Cite um especialista que defende a bandeira da desmilitarização da polícia.
    • Luiz Eduardo Soares, especialista em segurança pública, professor da UERJ e antropólogo. É autor de mais de 20  livros, entre eles Tudo ou Nada, Elite da Tropa e Cabeça de Porco.
  • Essa medida, a desmilitarização, acabaria com o problema da violência policial?
    • Não, esse é apenas o primeiro passo para o caminho árduo de construção de uma sociedade efetivamente democrática e comprometida com o respeito aos direitos humanos.
  • Atualmente, 22/01/14, qual é a principal via para efetivar essa medida?
    • A PEC-51, que tem Luiz Eduardo como um dos principais elaboradores e foi recentemente apresentada pelo senador Lindbergh Farias (PT/RJ), que visa, segundo ele, reformar o modelo policial.
  • O que significa, para uma polícia, ser militar?
    • No artigo 144 da Constituição, significa obrigá-la a copiar a organização do exército, do qual ela é considerada força reserva.
  • As finalidades para o exército e a PM são as mesmas?
    • Não. Portanto, só faria sentido reproduzir na polícia o formato do exército se as finalidades de ambas as instituições fossem as mesmas. Finalidades diferentes requerem estruturas organizacionais distintas.
  • Qual o objetivo do exército? Como ele se organiza e atua?
    • O exército tem como objetivo defender o território e a soberania nacionais. Para cumprir essa função, tem de organizar-se para realizar o pronto emprego, ou seja, mobilizar grandes contingentes humanos e materiais com máxima celeridade e rigorosa observância das ordens proferidas pelo comando. Precisa preparar-se para, no limite, fazer a guerra. Pronto emprego exige centralização decisória, hierarquia rígida e estrutura fortemente verticalizada.
  • O mesmo se aplicaria à polícia militar? Caso não, qual seria então seu papel?
    • Nada disso se aplica à polícia militar. Seu papel é garantir os direitos dos cidadãos, prevenindo e reprimindo violações, recorrendo ao uso comedido e proporcional da força.
  • Como a segurança é encarada do ponto de vista público?
    • Segurança é um bem público que deve ser provido universalmente e com equidade pelos profissionais incumbidos de prestar esse serviço à cidadania.
  • Quais as ocasiões em que o exército e polícia militar se assemelham?
    • Os confrontos armados são as únicas situações em que alguma semelhança poderia haver com o exército, ainda que mesmo nesses casos as diferenças sejam marcantes. Mas eles correspondem a menos de 1% das atividades que envolvem as PMs.
  • Como enfrentar as situações diariamente encontradas?
    • A imensa maioria dos desafios enfrentados pela polícia ostensiva são melhor resolvidos com a adoção de estratégias incompatíveis com a estrutura organizacional militar. Refiro-me ao policiamento comunitário, os nomes variam conforme o país.
  • E em que sentido o policiamento comunitário distingue-se das ações militares?
    • Essa metodologia é inteiramente distinta do "pronto emprego" e implica o seguinte: o ou a policial na rua não se limita a cumprir ordens, fazendo ronda de vigilância ou patrulhamento ditado pelo estado-maior da corporação, em busca de prisões em flagrante.

  • Como seria seu plano de ação?
    • O policial comunitário, ele ou ela, é o profissional responsável por agir como gestor local da segurança pública, o que significa, graças a uma educação interdisciplinar e altamente qualificada para: 
      • diagnosticar os problemas e identificar as prioridades, em diálogo com a comunidade, mas sem reproduzir seus preconceitos; 
      • planejar ações, mobilizando iniciativas multissetoriais do poder público, na perspectiva de prevenir e contando com o auxílio da comunidade, o que se obtém respeitando-a.
  • Mas isso representaria a perda da estrutura hierarquizada da corporação...
    • Para que haja esse tipo de atuação, é imprescindível valorizar quem atua na ponta, dotando essa pessoa dos meios de comunicação para convocar apoio e de autoridade para decidir. Há sempre supervisão e interconexão, mas é preciso que haja, sobretudo, autonomia para a criatividade e a adaptação plástica a circunstâncias que tendem a ser específicas aos locais e aos momentos. 
  • Quem de fato seria o mediador dos conflitos nesse modelo de policiamento comunitário?
    • Qualquer profissional que atua na ponta, sensível à complexidade da segurança pública, ao caráter multidimensional dos problemas e das soluções, ou seja, qualquer policial que atue como gestor ou gestora local da segurança pública, deve dialogar, evitar a judicialização sempre que possível, mediar conflitos, orientar-se pela prevenção e buscar acima de tudo garantir os direitos dos cidadãos.
  • A ação policial é a primeira saída?
    • Dependendo do tipo de problema, mais importante do que uma prisão e uma abordagem posterior ao evento problemático, pode ser muito mais efetivo iluminar e limpar uma praça, e estimular sua ocupação pela comunidade e pelo poder público, via secretarias de cultura e esportes. Os exemplos são inúmeros e cotidianos
  • Aí não precisaríamos da repressão pura e simples...
    • Esse é o espírito do trabalho preventivo a serviço dos cidadãos, garantindo direitos. Esse é o método que já se provou superior. Mas tudo isso requer uma organização horizontal, descentralizada e flexível. Justamente o inverso da estrutura militar.
  • E o controle interno?
    • Engana-se quem supõe que a adoção de um regimento disciplinar draconiano e inconstitucional seja necessária. Se isso funcionasse, nossas polícias seriam campeãs mundiais de honestidade e respeito aos direitos humanos. Eficazes são o sentido de responsabilidade, a qualidade da formação e o orgulho de sentir-se valorizado pela sociedade.
  • Qual a relação entre a polícia militar e o racismo?
    • Corporações militares tendem a ensejar culturas belicistas, cujo eixo é a ideia de que a luta se dá contra o inimigo. Nas PMs, tende a prosperar a ideia do inimigo interno, não raro projetada sobre a imagem estigmatizada do jovem pobre e negro. Uma polícia ostensiva preventiva para a democracia tem de cultuar a ideia de serviço público com vocação igualitária e radicalmente avessa ao racismo.
  • Já compreendemos que a desmilitarização é fundamental. Apenas ela seria a saída para os problemas atuais, sendo que a corporação seria a mesma?
    • Desmilitarizar é apenas uma das mudanças indispensáveis. Isolada, cada uma delas será insuficiente. E não nos iludamos: toda reforma institucional da segurança pública será somente um passo numa caminhada mais longa e difícil, rumo à construção de uma sociedade efetivamente democrática e comprometida com o respeito aos direitos humanos, na qual a justiça mereça o nome que tem.
  • O que está mais urgentemente em questão com a desmilitarização?
    • O que está em questão é, e com máxima urgência:
      • salvar jovens negros e pobres do genocídio, é acabar com as execuções extra-judiciais, as torturas, a criminalização dos pobres e negros, 
      • reduzir o número inacreditável de crimes letais intencionais, 
      • suspender o processo de encarceramento voraz, que atinge exclusivamente as camadas sociais prejudicadas pelas desigualdades brasileiras, 
      • sustar a aplicação seletiva das leis, que vem se dando em benefício das classes sociais superiores, dos brancos, dos moradores dos bairros afluentes de nossas cidades.
  • Não há um certo idealismo por parte dessa abordagem?
    • Não há nada de idealizações ao avaliar as reformas propostas. O que não significa que cada passo não seja de grande relevância e mereça todo empenho de quem se sensibiliza com a tragédia nacional, nessa área, tão decisiva e negligenciada.
  • Alguma outra proposta não citada, mas igualmente importante além da desmilitarização?
    • As transformações, um dia, terão de incluir a legalização das drogas, que considero uma mudança fundamental.
  • Historicamente, tivemos momentos que a luta pela desmilitarização da polícia aparece, como na promulgação da Constituição de 1988. Por que ela não aconteceu?
    •  Não houve comprometimento suficiente das forças mais democráticas, a sociedade não se mobilizou, os lobbies corporativistas das camadas superiores das polícias se mobilizaram, as forças conservadoras se uniram e funcionou a chantagem dos antigos líderes da ditadura, em declínio, mas ainda ativos.
  • As jornadas de junho de 2013 foram um outro momento importante na questão da desmilitarização, conte-nos um pouco mais sobre.
    • Nas jornadas de junho de 2013, e em seus desdobramentos, a brutalidade policial, que era e continua a ser cotidiana nos territórios populares, chegou à classe média e chocou segmentos da sociedade que antes ignoravam essa realidade ou lhe eram indiferentes.
  • Há ainda esperança de que esse movimento tome força?
    • A esperança reside na continuidade dos movimentos sociais, que adquiriram novo ímpeto, e em sua capacidade de pautar esse debate e incluí-lo na agenda política. Não vai ser fácil. Mas tampouco será impossível. Abriu-se para nós, pela primeira vez, uma temporada de frestas.
  • Como está a situação da questão da reforma do modelo policial no Congresso?
    • Há mais de 170 projetos no Congresso Nacional propondo a reforma do artigo 144 da Constituição. Vários incluem a desmilitarização. Nenhuma proposta de emenda constitucional é tão ousada e completa quanto a PEC-51. Nenhuma incorporou 25 anos de militância, experiência, debate e pesquisas, ouvindo profissionais das polícias e da universidade, operadores da justiça e protagonistas dos movimentos sociais, e buscando o denominador comum. Isso não significa unanimidade.
  • Há algum empecilho à concretização do projeto?
    • Há interesses contrariados e haverá resistências corporativistas, assim como posições ideológicas em oposição. Entretanto, o envolvimento de muitos movimentos, inclusive de policiais, já indica seu potencial para construir um consenso mínimo e sensibilizar a sociedade. 70% dos profissionais da segurança querem a mudança, como pesquisa de que participei demonstrou, em 2010. Não necessariamente querem a mesma mudança, mas o reconhecimento da falência do modelo atual é, em si mesmo, significativo.
  • Pode nos explicar melhor como se daria o funcionamento da PEC-51?
    • A PEC-51 visa reformar não apenas as PMs, desmilitarizando-as, mas o próprio modelo policial, atualmente baseado na divisão do ciclo do trabalho policial: uma polícia investiga, outra faz o trabalho ostensivo-preventivo. Pretende também instituir carreira única em cada polícia e transferir aos estados o poder de escolher o modelo que melhor atenda suas peculiaridades, desde que as diretrizes gerais sejam respeitadas. Hoje, em cada estado, as duas polícias, civis e militares, na verdade são quatro instituições ou universos sociais e profissionais distintos, porque há a polícia militar dos oficiais e dos não-oficiais (as praças), a polícia civil dos delegados e dos não-delegados como, por exemplo, os agentes, detetives, inspetores, escrivães etc. A PEC propõe que o ciclo de trabalho policial seja respeitado e cumprido em sua integralidade, por toda instituição policial. Ou seja, toda polícia deve investigar e prevenir. Propõe também a carreira única no interior de cada instituição policial. E propõe que toda polícia seja civil. A transição para o novo modelo, caracterizado pelo ciclo completo, a carreira única e a desmilitarização, uma vez aprovada a PEC, dar-se ia ao longo de muitos anos, respeitando-se todo direito adquirido de todos os trabalhadores policiais, inclusive, é claro, dos que hoje são militares. O processo seria conduzido pelos estados, que criariam suas novas polícias de acordo com suas necessidades. A realidade do Acre é diferente de São Paulo, por exemplo. A transição seria negociada e levada a cabo com transparência e acompanhamento da sociedade. As polícias seriam formadas pelo critério territorial ou de tipo criminal, ou por combinações de ambos. Um exemplo poderia ser o seguinte: o estado poderia criar polícias - sempre de ciclo completo, carreira única e civis - municipais nos maiores municípios, as quais focalizariam os crimes de pequeno potencial ofensivo, previstos na Lei 9.099; uma polícia estadual dedicada a prevenir e investigar a criminalidade correspondente aos demais tipos penais, salvo onde não houvesse polícia municipal; e uma polícia estadual destinada a trabalhar exclusivamente contra, por exemplo, os homicídios. Há muitas outras possibilidades autorizadas pela PEC, evidentemente, porque são vários os formatos que derivam da combinação dos critérios referidos.


Questionário, até o momento, baseado exclusivamente na entrevista feita por Viviane Tavares, da EPSJV/Fiocruz, com o professor Luiz Eduardo Soares.